segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Noiva que chegar atrasada para o casamento será multada

A prática, adotada em outros estados, ganha a adesão das paróquias brasilienses. A intenção é romper com um velho hábito e disciplinar os casais

Para se casar, o analista de sistema Pablo Scalia seguiu à risca o ritual dos noivos. Pediu ao sogro a mão da noiva em casamento, anunciou à família em sua festa de aniversário e marcou o dia em que trocará as alianças com a servidora pública Maria Fernanda Saback: 22 de maio de 2010. Vai ser uma cerimônia como manda o figurino para familiares e amigos, na Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no Lago Sul, às 20h em ponto. Se tem alguém disposto a quebrar a tradição nesta união, é Maria Fernanda. É melhor que ela chegue no horário marcado, caso contrário, terá de desembolsar R$ 765 pelo atraso. Sim, é isso mesmo. Aquele costume que ninguém sabe ao certo de onde veio ou quando surgiu, de deixar os convidados e o noivo ao pé do altar esperando a noiva aparecer pela porta da frente, está sendo severamente combatido por algumas igrejas do Distrito Federal. Se atrasar mais de 15 minutos paga multa à paróquia.

Show
Há quem diga que o suspense faz parte do show, já que o casamento seria um momento mais especial para a noiva do que para o noivo. O noivo, os convidados, o padre e quem mais estiver na cerimônia tem que prestar atenção somente nela. Daí o motivo do atraso.

Por mais que pareça, não é uma tradição exclusivamente brasileira. Na Grécia, é quase uma obrigação a noiva chegar mais tarde. No Reino Unido e nos Estados Unidos, era costume. Atualmente, não é aconselhável manter o hábito. E na versão em inglês do Google é possível encontrar várias dicas de etiqueta de comportamento da noiva, a primeira é sempre sobre o horário.

Uma das mais concorridas igrejas do DF, a Perpétuo Socorro se utiliza dessa prática. A tolerância é de 15 minutos. Quem ignorar a norma terá um prejuízo de um salário mínimo e meio, ou seja, R$ 765. Está previsto em contrato e ainda é pedido um cheque caução. A Igreja Dom Bosco e a Nossa Senhora do Lago são paróquias que adotam procedimento idêntico.

Rigoroso com prazos e horários, Pablo comemora a iniciativa. “O hábito de deixar os outros esperando pela noiva está acabando, talvez por causa da cobrança, que é válida”, elogia. “No Brasil, as coisas só funcionam quando mexem no bolso dos envolvidos”, completa.

Maria Fernanda Saback garante que não vai se atrasar, e nem é por causa da cobrança. “Fico preocupada com as pessoas que vão participar da cerimônia seguinte”, diz, referindo-se ao casamento que virá depois do seu, em maio, previsto para as 21h, caso a noiva não se atrase.

Para não ter problemas com o casal no segundo horário, a servidora Hellen Nozima reservou a igreja das 20h às 22h, em 15 de maio. “Justamente para não me preocupar com o atraso. Mas prometo chegar às 20h”, diz, quase sem querer. Ela vai trocar alianças com Emerson Esteves, após oito anos de namoro e noivado. Ele tem certeza que Hellen cumprirá com o prometido. “Esperar é ruim para os convidados, para os idosos que vão estar na igreja, e para o noivo, claro. Eu, por exemplo, não estou querendo esperar por muito tempo no altar”, avisa.

Cerimonialistas consultados pelo Correio garantem que a maioria das igrejas de Brasília pede cheque caução para o caso de atraso ou danos à instalação da igreja. Para o diretor de Atendimento do Procon, Oswaldo Morais, multa em caso de perda de horário é legal, desde que prevista em contrato. Mas não é legal o pedido de cheque caução.

As igrejas consultadas não souberam informar quando começou a cobrança. O padre Sírio Henriques, que chegou na Dom Bosco em 2002, informa que desde a sua primeira cerimônia, sete anos atrás, já estava prevista a multa para as atrasadinhas. “Não queremos confusão com ninguém, apenas disciplinar os casais”, justifica. “Se houver algum atraso, a gente negocia e abre mão do depósito do cheque”.

A coordenadora da secretaria de eventos da igreja Nossa Senhora do Lago, Ana de Castro, explica que a cobrança por atraso é uma orientação da Arquidiocese de Brasília. Dom João Braz de Avis, arcebispo Metropolitano de Brasília, assegura que nunca orientou as paróquias nesse sentido, mas é totalmente contra o atraso das noivas. “Eu mesmo já fiquei 45 minutos esperando por uma noiva no altar. Se fosse para pegar um avião, ela não teria viajado, porque a companhia aérea não tolera atrasos”, compara. “Esta é uma tradição tão antiga quanto desconfortante”, classifica.

"Eu mesmo já fiquei 45 minutos esperando por uma noiva no altar. Se fosse para pegar um avião, ela não teria viajado"
Dom João Braz de Avis, Arcebispo Metropolitano de Brasília

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